quarta-feira, outubro 05, 2005

A República serve melhor a Deus?

A República serve melhor Deus do que a Monarquia? Eis o problema fundamental, essencial. Eis o âmago da questão.

Para mim, a diferença que caracteriza os dois regimes, e que os tratados de Direito político formulam, é muito, é imenso - mas não é tudo. A hereditariedade, característica da Monarquia, garantindo uma continuidade no elemento-base do Poder, que a eleição, característica da República, transforma em instabilidade sistemática, é muito, é imenso, - mas não é tudo. Porque fará mais facilmente feliz um povo, uma República católica, do que uma Monarquia ateia ou agnóstica que se transforma automaticamente em República, como a República católica automaticamente se transforma em Monarquia. Porque o Ateísmo ou o Agnosticismo são as grandes alavancas propulsoras da Anarquia. E o Catolicismo é a essência da Ordem.

Se pela Monarquia vou mais facilmente para o Catolicismo, por este, vou, fatalmente, para a Monarquia. Se pela República vou mais facilmente para o Paganismo, por este vou, fatalmente, para a República. Porquê?

Porque o Catolicismo é a ordem integral. Porque o Paganismo é a Anarquia integral. Como a Monarquia é um regime essencialmente de ordem, e como a República é um regime essencialmente anárquico, é evidente que o Catolicismo leva à primeira, e o Paganismo leva à segunda. Portanto, o que é tudo, na diferença que caracteriza os dois regimes, não é a hereditariedade ou a eleição: é a Ordem integral ou a Anarquia, é Deus ou Satã. Por outras palavras: tudo se reduz a aceitar-se ou repudiar-se o Liberalismo.

Uma República anti-liberalista é preferível, para um monárquico integral como eu, a uma Monarquia liberal. Uma República liberalista deve ser preferível, para um monárquico liberal, a uma Monarquia anti-liberalista.

O mundo político, actualmente, já se não divide bem em monárquicos e republicanos: divide-se em liberais e anti-liberais. Os liberais estão todos presos pelo cordão umbilical da Urna; todos eles deitam incenso na ara absurda do Voto. Aos anti-liberais, une-os a Consciência de que o Sufrágio político, individualista, é uma mistificação.

O Liberalismo, ou seja, monárquico ou republicano, além de que repousa sobre uma mentira, o voto, e de que conduz a outra mentira - o Povo soberano, é, na sua essência, inimigo de Deus. Todo o poder vem de Deus - omnis potestas a Deo.

Mas para o Liberalismo, monárquico ou republicano, todo o poder emana do Sufrágio. E é por isso que nós assistimos, de vez em quando, ao afã dos liberalistas, no sentido de purificarem o Sufrágio. É que para eles, o Sufrágio é tudo! O homem, munido do papelinho branco, é omnipotente, omnisciente. Um milhão de homens de um lado, outro milhão de homens do outro lado. Empate. Quem vai desempatar? O Pistautira (oh!) que se esquecera de que era o grande dia do Povo soberano. Vão chamar o Pistautira!

E o Pistautira chega, e vota. E desempata…

Quem foi o omnipotente? Quem foi o omnisciente? O Pistautira… Isto é o Liberalismo.

O Sufrágio político é o mal. Corrigi-lo, como pretendem os liberais, é piorá-lo. Aperfeiçoá-lo é torná-lo mais nocivo ainda. O que é preciso é destruí-lo, é eliminá-lo, é substituí-lo pela representação de classes - apolítica: a representação dos Municípios e das Corporações, porque o Poder vem de Deus, e não do Povo. E a eliminação do Sufrágio político não é, portanto, atentatória das liberdades populares, antes, é a sua garantia máxima. Garantir a liberdade doméstica, a liberdade municipal e provincial, a liberdade corporativa - é deitar abaixo a Liberdade, árvore à sombra da qual têm germinado e florescido todas as tiranias, com a tirania do Número, do Anónimo, do Voto, à frente, mas é desenvolver a Nação, e abrir-lhe largos horizontes no futuro. A Liberdade é inimiga das liberdades. Onde a Liberdade impera, morrem, asfixiadas, as liberdades. Ora estas são fecundas, a Liberdade é estéril.

Liberalismo é o regime da Liberdade. A guerra ao Liberalismo é uma guerra santa. Foi ele quem atentou primeiro contra a Igreja; foi ele quem enfraqueceu e estiolou o Princípio monárquico.

Não precisamos de sair do nosso País. Portugal morre lentamente, - enterrado, afogado em estúpido materialismo, descrente do Rei, descrente de si próprio, farrapo do que foi, sombra do que foi. Esta situação deve-a, em primeiro lugar, aos malvados de 1820 e 1834 que em vez de defenderem o carácter nacional, o abastardaram, o estrangeiraram; deve-o, em segundo lugar, aos que cegos pela vaidade e pela ambição, se têm oposto à definição plena da aspiração política nacional, liberta do veneno revolucionário, e absolutamente integrada no pensamento de que tudo no homem deve tender a servir Deus, porque indivíduos e Nações só para o serviço de Deus nasceram.

Alfredo Pimenta - Nas Vésperas do Estado Novo - 1937

JSarto

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